domingo, 22 de setembro de 2013

Tabuleiro


Os peões, aos montes e passo a passo, lenta e maciçamente, partem no pelotão da frente. Caso sobrevivam, podem chegar ao alto escalão;

A torre, de vigor vertical e horizontal, caminha o quanto se quer, na defesa, no ataque, abertura do alçapão;

Os surpreendentes cavalos, que por sobre os outros obrigam o movimento do rei-opositor;

O bispo, que diagonalmente faz o sinal da cruz, ora e atua nas cruzadas, bem-feitor;

A (primeira-)dama, a melhor e mais gostosa de todas as peças, faz o que quer;

Mas no fim das contas é a queda do rei que decreta o fim da guerra, mesmo sem querer.

Adeus batucada


Acordo. Hoje resolvo não fazer nada que costumo fazer todos os dias. Não escovo os dentes, não tomo banho: enfrento a sujeira. No café da manhã, sirvo-me de uma caneca de cerveja importada bem gelada para afrontar a lucidez. Os telefones tocam e continuam a tocar, não atendo com o intuito de encarar a solidão. Saio de casa, caminho solitariamente e vou a lugares altos, encaro o medo de altura, da vertigem. Não ouço a música que tanto amo num só minuto deste dia, um embate com a falta da arte que me seduz. Não faço o que os outros querem, contesto tudo e a todos em nome da minha autonomia autodestrutiva. Até que decido dar fim a minha vida.

quarta-feira, 11 de setembro de 2013

Salve o meu carnaval














Amparo e me deparo
com a tua fé, no fim da fileira,
ao pé da ladeira da Sé.
Misericórdia mamulengo,
tenha dó dos bonecos de Olinda
e do Homem-da-Meia-Noite,
que sorriem todo tempo
pela felicidade do carnaval.
Sem pausa para a tristeza,
folclore do Maracatu Rural
pelos Quatro Cantos do mundo,
onde sequer descanso, sigo o ritual.
Aceito meu carma de Papangu;
encontro-te no Carmo, angu meu.

Trechos de um soneto

De início, pronta sintonia, alquimia
de perto e ao longe, quantas conversas!
Versa que o carinho transcorria,
viria a calhar e até hoje não cessa!


(...)

Saudade que dá, que se sente -
longitude, aperto cônscio no coração -
de repente, não mais que de repente.

Tu és

Do peso emotivo que te constitui, do rigor formal;

densidade que pensa maduramente, mérito sintático.

Como o Livro de Sonetos, naturalmente ático;

não se esgota, ao contrário, aguça-se a vibração aural.


quinta-feira, 29 de agosto de 2013

Do fundo do mar

Queria cantar enquanto submerso,
comunicar-me do fundo do mar.
De lá, pensaria na arte de rua,
no muro das lamentações
e questionaria: por quê?
Soltaria pipas coloridas
que combinassem
com os raios
de sol.
A noite,
escuridão
nas profundezas
do mar calmo, apenas
a buzina do navio, o apito
do trem e o vigor de querer,
melancolia transcendente de um
ordinário, louco pelo espírito animal.


sexta-feira, 2 de agosto de 2013

Tudo que se planta dá

                              Pareadas nos cosmos -
                asteráceas de jardim -
                                                           estrelas em solo arenoso,
de corpo barrigudo que as sustentam.
           Suas raízes, tão altas,
                                                 formam, com a forma de seu caule,
aquela sensação de solidez;
                                 sua cor, tão rosa,
destoa e é, portanto,
                                embate relativo ao restante do ambiente.
Árido e semiárido, no entanto,
                                              sorriem da beleza oriunda
             de muito sol e pouca água:
                    a flor do sertão, a rosa do deserto.